O Renegado - Sadie Jones

O RENEGADO
SADIE JONES
Record


Este não é um livro (The Outcast, 320p.) para qualquer leitor, prepare-se emocionalmente porque em alguns momentos você terá que ser forte e estar preparado. Talvez alguns leitores não gostem do ritmo lento da narrativa e queiram até abandoná-lo, mas aconselho-os a prosseguirem porque um determinado crime é o que faz com que você prossiga em frente. Não deu outra: foi dilacerante, emocionante e, ao mesmo tempo, surpreendentemente chocante!

A trama é focada em duas famílias: os Aldridge e os influentes Carmichael, mas por trás de tudo guardam terríveis e cruéis segredos. Infelizmente, ninguém da família podia falar ou mudar nada diante de tanta apatia, frieza e crueldade.

O enredo é ambientado numa cidadezinha inglesa devastada pela Segunda Guerra Mundial e, no decorrer da leitura, há uma sucessão de eventos até chegar ao momento atual, onde me vi querendo entrar na história e salvar cada um dos personagens diante da minha tamanha revolta e indignação. Só lendo mesmo para entender do que realmente estou falando.

Depois de dois anos cumprindo pena por um crime que chocou o povoado, o jovem Lewis Aldridge, de 19 anos, se encontra com Katherine
Carmichael, ou Kit, a garota que sempre o amou platonicamente sem ele saber e a única que foi capaz de compreendê-lo por toda a vida.

Na infância, ele sempre foi apegado à Lizzie, sua excêntrica mãe, que o mimava demais. Apesar do alcoolismo, ela sempre foi adorável, sensível e inteligente. Após a volta de Gilbert, seu marido e veterano da guerra, este rejeita o filho sem a menor explicação.

A presença do pai o perturbava porque era ameaçadora, já que estava acostumado com a mãe. Ao lado da esposa, Gilbert era um homem animado, simpático, mas um estranho quando se tratava do filho.

Essa rejeição se acentuou ainda mais após a morte da esposa, o que deixou marcas profundas em ambos. Instintivamente, Lewis procurou se agarrar a outros afetos para sobreviver, o que foi inútil, mesmo sendo ligado ao pai. Após algumas semanas, Gilbert decide refazer sua vida se casando com Alice, uma jovem gentil e ingênua.

Ela sentiu-se atraída pela necessidade de amar e pelo sofrimento deste, mas sentia que o enteado não queria e nem precisava dela, mesmo carregando uma tristeza profunda no olhar, já que tinha dez anos quando a mãe morreu por conta de uma fatalidade, da qual foi a única testemunha. Alice o considerava um caso perdido, mesmo que o marido acreditasse na superação do filho.

Esperava que ele tivesse conserto, porém perdeu a esperança de poder ajudar. Era como um pássaro ferido. E eles sempre acabam morrendo, concluiu.

Afetado pela perda, a partir dos 14 anos Lewis começou a se descontrolar e partir para agressões físicas violentas além de beber. Até que Gilbert acha que ele pode ser um perigo para si mesmo.

Ele nunca sabia o que o pai queria. Nunca conseguiu pensar num jeito de agradá-lo. Nunca conseguiu conviver com as pessoas o que tornava ainda mais difícil cuidar do seu bem-estar. Sentia que, apesar do pai estar coberto de razão, o detestava.

Impossível e imprevisível, o jovem passa a ser cada vez mais discriminado por todos que não compreendem sua verdadeira natureza, porque ele é alguém onde a corda sempre arrebenta do lado mais fraco, mas estava acostumado a sentir raiva de si mesmo.

No começo os pés doíam só enquanto pisava na areia quente e pouco após, mas a dor continuava até horas depois, fazendo com que ele se sentisse vivo e ligado ao mundo em vez de apenas entorpecido e fechado em si mesmo, como em geral era.

Apesar da rebeldia, Lewis sempre foi gentil e receptivo com quem gostava. Inteligente, adorava devanear. Queria se divertir e dar asas a imaginação e tornar o mundo um lugar mais justo. Se possível, até fazer justiça com as próprias mãos frente às crueldades impostas pela vida. Infelizmente, se afunda cada vez mais num caminho de trevas.

Tanto ele quanto a jovem Kit tem muito em comum: ambos sofrem bullying e crueldades nas mãos dos amigos além de serem renegados e abandonados pela família que os desprezam.

Calada e contida, ela se esforçava para se igualar a Tamsin, sua irmã, que era bonita e popular entre os amigos. Terna e tímida, Kit sempre divertia o amigo, mas nunca pensou que Lewis fosse tão vulnerável quanto ela, pois sempre fora simpático e o viu como um herói.

Naquele dia, estava com 11 anos e sabia que era apaixonada por ele. Era o seu segredo e a sua fantasia. Não sentia falta dele, nem sentia outras coisas que tinha lido sobre a paixão, mas ele estava no coração dela. Às vezes, ficava surpresa por ele não perceber.

Era uma jovem adorável e orgulhosa, porém teimosa. Desprezava profundamente o pai, odiava a forma como ele falava, o que a irritava, além da cisma dele com Lewis e pelo fato de se achar melhor do que os outros.

Kit era corajosa, mas infeliz; infantil, mas madura. Aprendera a se resguardar e não esperava que ninguém a consolasse. Ficava indefesa quando a raiva e o medo a tingiam, porque ao mesmo tempo em que era forte, era extremamente frágil, já que sua dor era insuportável! Sua solidão e seu sentimento de injustiça aumenta cada vez mais, o que faz com que queira desabafar com o amigo seus piores segredos. Dará vazão aos seus verdadeiros sentimentos?

Viu que tinha um destino do qual não podia escapar. Tinha vontade ir embora, chorar e encontrar alguém que a salvasse, qualquer pessoa; mas, por outro lado, sentia-se forte como um soldado. Resolveu ser corajosa e enfrentar a situação. Teria de ser muito forte para lidar com aquilo.
Pela primeira vez, quis ser fraca, se entregar a Lewis e deixar que ele a abraçasse. Precisava sentir aquilo: o abraço de Lewis. Queria um refúgio.

Lewis nunca se imaginou tendo um futuro, se sentia um náufrago. Até que algo grave acontece em meio a uma descoberta; e depois de todas as esperanças perdidas surge algo em que se apegar numa luz no fim do túnel. Tudo isso, a partir da pág. 267.

Emocionante e com um final chocante e que me dilacerou o coração, cada um vai encontrar a sua força interior e salvar a si mesmo e mostrar o valor da vida e a importância da compaixão.

— Às vezes parece — ele fez um esforço —, parece que estou me afastando de tudo, como se o mundo estivesse longe de mim. E escuro. E eu também estou no escuro. Nos últimos tempos, não sei se eu consigo voltar...

A capa é linda e este abraço, a meu ver, representa o anseio e a carência dos protagonistas diante das tragédias que a vida impusera. Por outro lado, ela me enganou direitinho porque eu pensava que fosse um romance açucarado, mas ledo engano, possui uma carga dramática intensa. E senti um pouco de falta do romantismo.

Achava que merecia ser um nada, invisível. Ainda ansiava e tinha a necessidade infantil e intrínseca de ser cuidado e agradado como uma criança.

Tem um trecho do poema “If”, de Rudyard Kipling, traduzido por Guilherme de Almeida — presente na pág. 225 (Para lê-lo, clique AQUI) — que reflete exatamente a mensagem deste livro.

Dividido em três partes, o romance traz uma narrativa sensível, visceral e intensa, onde a autora nos mostra a outra face do ser humano. Lendo-o quase perdi totalmente a minha fé na humanidade.

Mesmo que a tristeza e a dor aliadas  sejam confortadoras
para o protagonista, a meu ver algumas cenas foram dilacerantes, ainda mais por serem assustadoras, mas para ele era agradável e, ao mesmo tempo, um alívio. Não vou me estender para não soltar spoilers, mas infelizmente muitos jovens tomam essa atitude sem pensar nas consequências que podem advir.

Por que não fazer uma coisa que vai ajudar? Como não fazer uma coisa ruim, se só machuca você?

A irracionalidade aliada a uma mentalidade pequena também me chocou diante de algumas atitudes cruéis em nome da educação naquele tempo.

Durante a leitura ficava com aquela angústia no peito juntamente com o aperto na garganta. Um dos momentos mais comoventes está presente na pág. 292, onde finalmente o personagem confronta o pai depois de anos de ressentimentos acumulados culminando no desfecho rumo à redenção esperada. Apesar do final satisfatório, queria que a autora tivesse desenvolvido melhor. Até pesquisei se teria uma sequência, mas não encontrei nada a respeito. Se você souber de algo, me avise.

Um livro que nos mostra até onde o poder do amor pode nos levar. O ser humano é capaz de suportar tamanha dor e crueldade, mesmo sendo levado às brutais consequências de um amor negado pela criação que teve? Será que em meio a tanta desgraça é possível realmente alcançar a redenção?

— Não, eu sou mau. O mundo também é, (...). Você é a única coisa boa que já encontrei. Só o jeito de você ver as coisas já faz com que elas melhorem. Por isso, achei que você fosse me tornar melhor também, mas não pode. E achei que pudesse salvá-la. Mas não posso.

Um romance que vai te dilacerar e, ao mesmo tempo, te enternecer a cada momento onde se verá torcendo por um final feliz diante das complexidades da vida.

Por ser eclética, sempre diversifico nas minhas leituras, mas todos sabem que amo um drama, porém no caso deste faltam-me palavras para expressar tudo o que realmente senti ao longo da leitura. Só sei que tive um torvelinho de emoções conflitantes, sendo que na maior parte delas ficando com o meu coração disparado, o grito sufocado na garganta e, finalmente, culminando no grito da vitória!


Um comentário:

  1. Não conhecia o livro, já está anotado aqui a dica de leitura ;)
    Carla Fernanda, convido para conhecer meu livro "Feitiço", vencedor do concurso "Do manuscrito ao livro" publicado pela editora Novo Conceito. Espero que goste!
    Bjs
    http://lizajoneslivros.wix.com/lizajones
    http://eternamente-princesa.blogspot.com.br/

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